A Cultura Nerd e o Aprendizado de Idiomas

Parte 6 – “A jogo” diferente

Se você tiver uma ideia para um jogo incrível, é melhor fazer um RPG ou jogo narrativo, está provado que só é possível revolucionar os Board Games em alemão. Pronto, essa será minha última e desastrosa referência à canção Língua de Caetano Veloso nestes posts. Agora que tirei isso do caminho posso, finalmente, tratar do assunto.

Olhando de longe, nenhum país parece combinar menos com a cultura nerd / pop do que a Alemanha (talvez, a França, mas isso fica para depois). Afinal, um povo intelectualizado, famoso por suas realizações na engenharia, por sua pontualidade, profissionalismo e seriedade dificilmente encontraria tempo para perder com o entretenimento fútil que compõe aquilo que chamamos de cultura nerd, certo? É… errado!

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Além de todas essas famas supracitadas, os germânicos também são conhecidos por desenvolver excelentes jogos de tabuleiro ou board games. Embora, o termo possua uma tradução para lá de satisfatória, muitos fãs brasileiros preferem usar o termo em inglês (board games) de modo a evitar que o ouvinte pense em qualquer coisa que possa envolver a frase “avance 2 casas”. Os alemães são tão reconhecidos pela habilidade na criação de jogos de tabuleiro que deram origem a um novo tipo de jogo com suas próprias características e mecânicas típicas. Tais jogos são chamados em inglês de German-Style Board Game ou Jogo de Tabuleiro em Estilo Alemão. Por motivos óbvios, não recebem essa designação na própria Alemanha, lá são conhecidos como: Autorenspiel (Jogo Autoral).

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Os Autorenspiele são caracterizados pelas regras simples, pelo tempo de jogo curto (de 30 a 60 minutos), pelo alto nível de interação entre os jogadores e pela qualidade dos elementos gráficos. Suas mecânicas (regras e procedimentos de jogo), em geral, se focam na estratégia, no gerenciamento de recursos, possuem pouca dependência da sorte, muito pouco PvP (player vs player, jogador contra jogador, confronto direto entre os jogadores), e não incluem a eliminação de jogadores, ou seja, tentam manter todos os participantes até o final da partida. Dessas características, é esse estilo mais estrategista das mecânicas que mais os diferencia em relação aos board games americanos que tendem a ser mais dramáticos, dependerem mais da sorte e se focarem mais em conflitos.

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Para se ter uma ideia do tamanho do sucesso dos jogos de tabuleiros alemães o jogo “Colonizadores de Catan” vendeu mais de 15 milhões de cópias ao redor do mundo, mais do que o dobro das vendas de Halo 3 (acho que só não vendeu mais que o disco da Adele, e quem disse que os jogos de tabuleiro são uma arte em extinção?), e ganhou versões em diversas línguas, além de diversas expansões. Contudo, mesmo com toda essa fama, esse sucesso e esses números sempre haverá um ou outro Autorenspiel que acabará não recebendo uma tradução. Uma ou outra expansão acabará permanecendo disponível apenas no idioma original (alemão, aqui, no caso). Além disso, sempre vai haver aquele fã que gostaria de ter acesso a um Autorenspiel ainda mais autoral (aquele Board Game Connoisseur), aquele que não encontra tanto espaço no mercado, pelo menos não a ponto de justificar uma tradução.

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Assim, como ocorre com as demais produções culturais nerds mencionadas nos artigos anteriores (RPGs, animes, videogames) essa falta de acesso no idioma nativo do fã acaba por exercer (em alguns deles) uma influência positiva, que, em conjunção com outros fatores, pode se transformar em uma motivação ainda mais poderosa que a vida profissional ou acadêmica (conforme mencionado na Parte 2).

Encerramos por aqui a primeira parte. Na continuação, falaremos de coisas que não são nerds, mas que quando encaradas pelo prisma nerd, podem ter o mesmo efeito para o aprendizado da língua alemã, de Max Webber à cerveja artesanal. Auf Wiedersehen!

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