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“Chato é aquele que explica tudo tim-tim por tim-tim e depois ainda entra em detalhes”
Millôr Fernandes

 

Um dos objetivos deste blog é discutir aquelas palavrinhas e expressões complicadas de se entender no português. Aquelas expressões que os estudantes de português (ou falantes de português como língua estrangeira) não conseguem entender e que os falantes de português (como língua nativa) não conseguem explicar. Enfim, explicar aquelas palavrinhas e expressões chatas.

 

No caso específico deste post, o objetivo é explicar tim-tim por tim-tim (em um parágrafo) e depois entrar em detalhes (no parágrafo seguinte) a respeito do sentido da palavra “chato”.

Porém, como todo chato que se preze, este post não poderia tentar explicar o sentido de uma palavra sem destilar uma (falsa) profunda erudição. Por isso, o “chato” não será explicado (tim-tim por tim-tim) sem a presença de uma obra de referência. Porém, de novo, como todo chato que se preze, tal obra de referência não será uma obra de alta estatura filosófica, literária ou poética, não será nem ao menos um texto, mas sim uma música de um cara bem chato. Tal música, é claro, como não poderia deixar de ser, é “O Chato” de Oswaldo Montenegro (caso não conheça essa “referência bibliográfica” ouça a música e leia a letra aqui).</p

Tendo cumprido a obrigação (na condição de chato) de fazer uma introdução enorme, vamos, enfim, ao sentido de “chato”. O primeiro sentido da palavra “chato” (aquele que recebe o número 1 e, talvez também o número 2 no dicionário) é: liso, plano, sem relevo (ou quase sem relevo). Como adjetivo, geralmente é usado para superfícies ou áreas. O adjetivo chato deve então ter passado, por semelhança de sentido, a designar uma característica da personalidade e do comportamento humano. “Todo chato é calminho como se faltasse sal”. Logo, uma pessoa chata é uma pessoa plana, sem relevo, sem alterações. Ou seja, uma pessoa maçante, educada, boazinha, uma pessoa sem defeito grave, exceto, é claro, o de ser chata. O mesmo pode ser dito de uma música, um filme, um livro. Um filme mal feito, por exemplo, é um filme horroroso, trash, mas não um filme chato. Esse último é bem feito, bem atuado, bem dirigido, bem fotografado, sem defeitos técnicos, sem furos de roteiro, sem defeitos, exceto, é claro, o de ser chato.

 

Por isso, é importante não confundir os chatos com os demais tipos desagradáveis. É injusto confundi-lo com o falso, com o intransigente, com o mal-educado, com o irascível, com o arrogante ou com o trambiqueiro. Perto deles, o chato é inofensivo. O chato paga seus impostos em dia, recicla seu lixo, segue o dress-code, é educado, fala em um volume moderado, não mente, ama os animais, não arruma confusões e na maioria das vezes quer o bem do próximo (incluindo o seu). Justamente por ser tão do bem, tão correto, tão ético e tão consciente é que você não suporta ficar perto dele. Nem ouvir os seus conselhos, suas dicas ou informações a respeito do que é moral, correto, ético, saudável, etc.

 

Existe ainda uma progressão (ou seria evolução?) do chato: o chato de galocha. Galocha era um tipo de bota feita ou revestida de borracha que tinha (hoje estão praticamente extintas) a função de proteger os pés e as meias da chuva, da lama ou de outras substâncias que poderiam penetrar em calçados normais e permeáveis. Diz, então, a lenda etimológica (que é sempre muito mais interessante do que qualquer teoria etimológica) que o chato de galocha seria aquele que mesmo em um dia chuvoso, colocaria as suas galochas e faria uma visita “aos amigos”. Logo, chato de galocha é aquele que não deixa em paz, que não dá sossego.

 

É claro, chato também pode ser usado como substantivo. Nesse uso, é o nome popular do Piolho-da-Púbis.Acho que não é preciso explicar, por que esse inseto parasita nada simpático recebeu esse nome, não é?

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