Por que o Superman é bom?

Parte 3 – Superman, 1978

Este é o terceiro de uma série de posts a respeito do Superman para comemorar a estreia do mais novo filme do mais antigo super-herói. Após identificarmos a abordagem à questão “por que o Superman é bom?” como um importante ingrediente para as mais recentes histórias do Superman (parte 1), percebemos que em épocas menos recentes, tal abordagem não se fazia necessária, uma vez que eram muito claros os motivos pelos quais o último filho de Krypton era o símbolo da moral: a defesa da justiça, verdade e do modo americano (identificados, então, naquele contexto, com o bem – parte 2). Nesta terceira parte, nos concentraremos em como o clássico filme de Richard Donner (Superman de 1978) trata tal questão.

Como o filme de Donner se enquadra em um período de transição (parte 2), Donner não pode (e nem quer) se apoiar na “verdade, justiça e o modo americano”, porém, como seu filme se encontra em uma época “mais inocente” nas histórias de super-heróis, não precisa se esforçar tanto para construir uma personalidade que justifique o fato do Superman não dominar o mundo. Então, em seu filme, tal questão é abordada de forma negativa (“porque o Superman não é mal?”) e, digamos, superegoica.

Ou seja, no filme de 1978, o Superman não é mal porque possui superego. Isso aquele mesmo do Freud. Embora, meus conhecimentos de psicanálise freudiana não sirvam para mais do que discussões de bar, é exatamente esse o espírito dos textos deste blog.

No geral, o superego está associado com a figura do pai, que acaba por nos inserir a ideia de que existe uma limitação física e, depois, moral para nossos desejos. Voltando a uma ideia da parte 2, o Superman do filme de Donner é bom, porque seus dois pais o ensinam que mesmo que não haja uma limitação física para seus atos, deve haver uma limitação moral. O que é ressaltado com a morte de seu pai terráqueo (que mesmo com todos os seus poderes o herói não foi capaz de salvar) e com o discurso de seu pai celeste (que tem o poder aumentado pelo efeito etéreo de cabeça flutuante e pela poderosa voz de Marlon Brando). Ou seja, podemos dizer que Clark possui duas camadas de superego. A primeira delas, criada por Jonhattan Kent durante sua infância na pequena cidade de Smallville e a segunda delas, criada pelo holograma de Jor-El na Fortaleza da Solidão. Essas duas criações formam em Kal-El a ideia de que mesmo que ele possa – capacidade – interferir em tudo, em algumas coisas ele não pode – moralmente – interferir. Dentre essas coisas nas quais Kal-El não poderia – moralmente – interferir, a principal delas seria a história humana (na definição de Jor-El) ou o destino (em uma definição mais comum). Essa história humana inalterável se manifesta no filme pela morte de Jonhattan Kent e de Lois Lane.

É este último evento, contudo, que leva ao clímax e a mais memorável cena do filme, quando um indignado Superman – por ter perdido sua amada mesmo depois de salvar o mundo – decide voltar no tempo para salvar a vida de Lois, revoltando-se assim contra os desígnios de seu pai holográfico, Jor-El, cuja voz espectral pode ser ouvida pelo Homem de Aço enquanto, temporariamente, rompe a única limitação que lhe havia sido imposta.

Creio que o fato de Lois servir como motivação para essa violação por parte do Homem de Aço pode ser lida de duas formas não excludentes: na primeira, Lois, seria mais uma manifestação do feminino sombrio, ou seja, Lois, como Eva, portaria o mal, fazendo com que o homem (no caso, o Super) desobedecesse à única restrição imposta pelo pai celestial; já na segunda, Lois seria a motivação para que o Super, finalmente, se transformasse em homem, ou seja, atingisse a maturidade ao superar a influência do “fantasma” de seu pai e ao traçar seu próprio caminho.

Eu prefiro ver a cena da segunda forma. Um pouco também pela belíssima música Super-Homem, a Cançao de Gilberto Gil:

Quem sabe o super-homem venha nos restituir a glória
Mudando como um Deus o curso da história
Por causa da mulher

Na próxima parte, chegaremos ao filme mais recente de Nolan / Snyder /Goyer. Qual será abordagem dada por esse filme que tenta reconstruir o Homem de Aço para as gerações mais recentes?