Por que os Nossos Vizinhos Paraguaios Falam Guarani?
Como o guarani sobreviveu e se desenvolveu para hoje ser uma língua oficial do Paraguai.
Que línguas de origem indígena ainda sejam predominantes nas Américas não surpreende ninguém. O aimará e o quechua tem status de língua oficial no Peru, e aqui no Brasil já tivemos nossa língua-geral, o nhenngatu, que até finais dos século XVII era a língua predominante no país. Mas é difícil olhar para o Paraguai, Estado da Bacia do Paraná que banha países que aceitam apenas línguas de origens europeia como oficiais (Argentina, Uruguai e Brasil), e não se perguntar o que teria de tanto especial no país para que o guarani não apenas sobrevivesse, mas também se tornasse tão predominante quando o espanhol.
A história do guarani como língua escrita e falada é anterior à história do Paraguai e até mesmo do mundo. A mitologia guarani diz que a língua foi criada pela divindade Ñamandu antes da Terra ou dos Homens. Historicamente o guarani provavelmente compartilha uma língua ancestral com o tupi, fazendo parte do mesmo grupo familiar que esta, o Tupi-Guarani.
Reduções jesuíticas guaranis ao longo do Rio Paraná e Ave Maria em guarani
Em 1608 a Coroa Espanhola permitiu os jesuítas a fundar missões ao longo do rio Paraná. No início os jesuítas tentaram utilizar o espanhol para converter a população local, mas finalmente cederam para a língua guarani, um fator vital para a preservação desta mesma. Eventualmente, para contrabalancear incursões de bandeirantes a procura de escravos, os jesuítas permitiram os guaranis a organizar forças militares, aprofundando ainda mais o senso cultural e linguístico destes. A história porém é cheia de tragédias: Espanha e Portugal assinariam o Tratado de Madri (1750), dividindo a Bacia do Paraná entre si e pondo um fim nas missões jesuíticas e na relativa independência dos guaranis. Hoje o leitor pode visitar as ruínas de tais reduções nas proximidades de Santa Maria, Rio Grande do Sul, ou na província de Misiones, Argentina. A predominância da cultura guarani iria desaparecer ao longo do rio Paraná a partir de então, mas no atual Paraguai ela se manteve graças à dificuldade de acesso ao mesmo.
De Francia, primeiro presidente do Paraguai e principal responsavél pela manuntenção do guaraní como a língua do governo
Após as Guerras de Independência, o Paraguai se isolou do mundo seguindo a política do Presidente José Gaspar Rodríguez de Francia de buscar auto-suficiência. De Francia usava a população guaranínofona como base de apoio contra a elite hispânica. Ele chegou inclusive a banir o casamento entre os criolos (filhos de espanhóis) e a fazer uso de informantes falantes de guarani, os pyragues (tradução: velozes), como peça-chave no seu regime. O guarani permaneceu como a língua do governo até a Guerra do Paraguai (1864-1870), quando as potências vitoriosas determinaram a adoção do espanhol como língua oficial da nova república.
O idioma indígena, porém, sobreviveu nas línguas dos paraguaios, principalmente os de classes baixa e média. Foi utilizado pelo Exército durante a Guerra do Chaco contra a Bolívia, içando-a novamente aos holofotes do país. Uma onda patriótica na década de 60, durante o governo do General Stroessner (governou de 1952 a 1988) resgatou o orgulho do idioma. Stroessner também ressuscitou o sistema de pyragues, presenteou terras a camponeses guaraninófonos leais à ele, e, por fim, institui a língua guarani como oficial. Com a Constituição de 1992 o status do guarani foi reafirmado e hoje ocupa um espaço vital junto com o espanhol. Esta realidade conflita com a de países como a Bolívia ou o Peru, nos quais as línguas indígenas também possuem status oficial, mas cujo uso é mais local do que geral.
Uma curiosidade
Na copa do mundo de 2010 na África do Sul, Espanha e Paraguai se enfrentaram em campo. Os jogadores paraguaios foram instruídos a somente falar guarani em campo para que os espanhóis não entendessem suas táticas de jogo
Hoje o guarani é falado por aproximadamente 90% dos paraguaios, 6,300 de 7 milhões. A língua passou por muitas modificações nestes últimos 500 anos de história, desde a chegada dos espanhóis no continente até hoje, a ponto de que alguns a definem como uma língua “criola”, “mestiça”. Criola ou não, o que importa é que o guarani sobreviveu e permanece como uma língua dinâmica, forte e relevante até hoje.
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