Tropicália: a “homenagem”

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A tropicália da Odebrecht é um condomínio de alto padrão construído em Salvador, BA. Lendo o folder promocional, acabei por descobrir que a Odebrecht também nasceu na Bahia, assim como o movimento tropicália original. É importante entender exatamente o que é a tropicália da Odebrecht para sermos capazes de entender toda a birra de Tom Zé (e de Gil, e de Caetano) com essa tal “homenagem” ao movimento que criaram.

 

O condomínio Tropicália é um desses condomínios fechados modernos repletos de opções de lazer, para adultos e crianças, com o fim de que seja cada vez menos necessário deixar a área protegida do condomínio. Não é por acaso que muitos sociólogos, estudiosos da arquitetura das cidades e outros pensadores da vida urbana, comparam tais condomínios aos castelos e cidades muradas da Europa Medieval. A ideia, no fundo, é a mesma: ser o mais autossuficiente possível para que as saídas da área murada, e, portanto, protegida, possam ser evitadas o máximo possível.

 

Esse seria, segundo Tom Zé, o cerne da questão. A Tropicália, o movimento artístico, se focava na mistura de tipos urbanos (e rurais), de pessoas, de ritmo, de cores e de modos. Para os tropicalistas, o que esses grandes condomínios modernos parecem fazer é justamente o contrário, parecem ter sua estrutura planejada para impedir a mistura, ou antes, impedir o contato (controle de acesso, espaços privativos, elevadores exclusivos, piscinas próprias, etc). Essa incompatibilidade filosófica deixa de ser apenas uma disputa por palavras e conceitos, quando colocada no contexto das mais recentes manifestações dos movimentos progressistas contra algumas atitudes da prefeitura de Salvador acusada, por esses, de estar colaborando com e promovendo a “privatização” das áreas públicas da cidade (carnaval, praias, praças). A questão, então, deixa o plano do linguístico/cultural, para se tornar uma questão social e de planejamento urbano.

 

É nessa diferença ideológica e política, que se baseiam Tom Zé e os tropicalistas para rechaçarem a “homenagem” feita pela Odebrecht. Essa, pelo visto, parece ser a única base para que os tropicalistas exijam a mudança de nome, visto que do ponto de vista legal, a mudança de nome talvez não se faça necessária.

 

Tropicália é o nome de um movimento cultural. Que segundo a Odebrecht não foi nem cunhado por esses artistas (e sim, por um artista plástico, Hélio Oiticica. O nome da obra de Otiticica foi utilizado, como referência, para batizar uma música de Caetano e, por conseguinte, todo o movimento) e em nenhum momento foi registrado ou transformado em propriedade intelectual, visto que, de acordo com o próprio ideário do movimento, que eles agora utilizam como argumento para questionar a utilização do nome, tal registro não seria apenas desnecessário, como seria um impedimento à ideia de fusão e de mistura (não existia a licença “Creative Commons” na época). Logo, os tropicalistas não podem se basear na infração de direitos autorais em um eventual processo para a mudança de nome do empreendimento (até aqui em Caçapava, existe um estabelecimento chamado Tropicália, uma pequena casa de sucos e lanches naturais, a questão levantada por Veloso não é o uso do nome, mas a forma de tal uso). Quanto as referências a nomes ou a trecho famosos de canções, também acredito que nada pode ser feito. Embora, todo o folder promocional seja composto por trocadilhos (ou referências) com famosas canções da MPB (de Caetano, de Belchior, de Jorge Ben Jor), não me parece que a Odebrecht possa ser acusada de algo mais do que de falta de criatividade (que, embora nada agradável, não pode ser criminalizada: não vai haver cadeia suficiente em lugar algum do mundo).

 

A série de posts contínua na semana que vem onde tentaremos explicar a origem do nome e do movimento tropicália.

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